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quarta-feira, 28 de julho de 2010

Cauã

Tinha gente de fora qdo o Bambuíra chegou com a família..Sabadão na roça, noite, chovia, o fogão a lenha comia solto com um caldinho verde sempre quente...lá fora sempre frio. O Inverno nas montanhas gela os ossos, molha a alma.
Lelê já foi se acomodando nas almofadas, com um chocalho e esqueceu da vida..Bambuíra já pegou na viola..e esqueceu da vida..
E lá estava ele, Cauã, nos seus 7 anos de vida e bem vivida vida...na porta de entrada, olhando pro ambiente, fazendo um reconhecimento de quem estava por lá.
Ele me deu um olá discreto. Ele é assim, só nos primeiros segundos.
Depois estava na roda, lá na sala, sentadinho no chão, conversando com as pessoas como se fossem suas amigas de longa data.
Chamou a atenção de quem não conhecia Cauã.
Eu só dei risada..já conheço este menino de longas datas.
Cauã estava contando que no domingo sairia para uma cavalgada,e que teria que acordar cedo no domingo, tipo 5 da manhã, pra arriar cavalo, se aprumar na cela (não que ele precise de nada destas coisas.. já andou muito em pêlo, pela roça adentro), com roupa de rodeio, e assim preparado, fazer parte da Cavalgada de Bom Jesus, onde tropeiros e cavaleiros se reúnem para uma cavalgada ate a igreja em Santa Bárbara, para missa e comes da roça.
Cauã vai no seu cavalo, presente do avô materno, mateiro antigo, cavaleiro que ensinou o neto a montar qdo Cauã tinha 2 anos e meio.
E aí Cauã continua suas estórias, de quando caiu do cavalo.
Sabe, neste momento eu sabia o que iria acontecer. Tudo parou. As violas silenciaram, os batuques tb. Todos os adultos na festa puzeram olhos no menino franzino sentadinho no chão. Contou que caiu não porque tivesse dois anos e meio, mas sim porque sua avó abriu a sombrinha bem na cara do cavalo, e é claro que o bicho esperneou e jogou o menino no chão, pra fugir em disparada. Disse que foi a primeira e única vez que caiu de um cavalo.
O dia do Cauã rola inteirinho procurando alguém pra andar com ele no dia seguinte de cavalo..rs..ele tá sempre perguntando se alguém vai com ele, que ele ensina..e tem sempre quem pare tudo o que faz pra gozar da companhia deste menino inteligente e esperto, que anda a cavalo como ninguém.
Não adianta não comparar com as crianças da cidade, porque são universos diferentes.
Os brinquedos de Cauã são aqueles que as musicas cantam: peão, figurinhas com amigos, coisinhas feitas com pedras e madeiras, material da mata..Cauã gosta de contar porque o porco morde forte, com perigo ate de matar.
Gosta de contar passeios na mata, onde os animais se escondem mas ele consegue rastrear, porque lhe ensinaram a seguir pegadas...
Gosta de fogão a lenha, banho no rio (banho que ele toma todos os dias quase).
Engraçado vir pra roça, em busca de paz e raízes e encontrar isso numa criança de 7 anos. Os olhos de Cauã são de paz e fogo..fogo pela vida simples, pelos cavalos, pelo peão e rios.
Se despediu cedo, avisando que iria dormir um pouco pra acordar de bem pra montar.
Levei Cauã pro quarto, montei um monte de cobertas e ele se enfiou no quentinho. Me deu um abraço,e confirmou que iria cavalgar no dia seguinte bem cedo.
Não fui ver Cauã desta vez, mas eu adivinho o menino sentado sem conter um enorme sorriso banguela no rosto branco e sardento.

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